LEMBRANDO DE MORRO DO CHAPÉU (1)
São Paulo, 06 de Agosto de 2009.
Caro amigo,
Acredite, mas somente ontem tive um tempinho para me dedicar à organização das fotos que tirei em Morro do Chapéu. É que aqui o tempo corre em alta velocidade: quando a gente vê, o dia acabou. Tudo muito diferente do tempo em Morro do Chapéu, correndo devagar. Se quando estava aí isso me parecia enfadonho, agora, aqui, é o que mais desejo.
Aproveito a oportunidade para lhe dizer que gostei muito de conhecer Morro do Chapéu. Ainda ontem, às voltas com a organização das fotos, percorri as ruas da cidade, revi seus casarões, passei pelo restaurante italiano e juro que senti o aroma delicioso exalando da cozinha da D. Teresinha. Jamais esquecerei essa simpática senhora, sua figura frágil e delicada, a contrastar com a garra com que conduz o seu empreendimento, assim como também será impossível esquecer a gentileza do Adriano, seu fiel escudeiro. E como não posso deixar de dizer, impossível será esquecer seu gnocchi com brachola, sem dúvida o melhor que já degustei.
Minhas lembranças vagaram também pela praça do acarajé e da tapioca, pelo Mercado Cultural, onde conheci artesões que retratam na palha, no barro, na pedra, no tecido, o que suas imaginações captam da riqueza cultural do local.
Vale dizer que foi ali que me emocionei pela primeira vez, e se digo assim é porque voltei a me emocionar depois, com um grupo de crianças absolutamente engajadas com suas raízes. Falo dos meninos e meninas do projeto Oca da Minhoca. Falo do espetáculo que eles nos proporcionaram através da dança, música e canto. Impossível não se contagiar com o entusiasmo e alegria daquelas crianças irmanadas com a dedicação dos mestres compromissados com o projeto. E foi desse mercado que trouxe para casa duas esculturas de barro. São duas baianas assinadas por Goia, artista Morrense, que tive a honra e o privilégio de conhecer e, por coincidência, de nome parecido ao grande artista espanhol. Penso que é o dedo do destino que nomeia de modo assemelhado pessoas tão diferentes, mas igualmente talentosas.
Senti um quê de nostalgia a me lembrar da pousada das Bromélias. Ali eu ficava à procura de um sinal na internet — tributo da vida moderna, que a gente carrega como um fardo para onde quer que se vá — muito mais por vício do que por necessidade.
Sei que por muito tempo ainda vou associar sexta-feira ao dia de feira livre e vou me lembrar do colorido, do cheiro e do sabor das rapaduras, dos doces de cocos e de outras castanhas e dos queijos, especialmente o de coalho, enfim, coisas da Terra transformadas pelas mãos criativas do povo Morrense em tantas delícias.
Não foi só da cidade que gostei, mas também da natureza bem desenhada do lugar. Exuberante em Ferro Doido e Possidônio, singela na paisagem dos morros cobertos com vegetação arbustiva onde se destacam as exóticas cactáceas.
Hoje não dá mais pra olhar o céu sem pensar um bocadinho no Sr. Alonso e nas histórias que ouvi sobre aparições de OVNI. Criatividade, realidade, seja como for, o que guardo disso tudo é um misto de imaginação e cultura.
Gosto de viajar, conhecer lugares e pessoas e me encantar com as diferenças. Sempre volto enriquecida com o que aprendo e aprendi muito em Morro do Chapéu.
Desculpe-me se me alonguei, mas são fatos e detalhes que muito me disseram, e que ainda me são bem presentes.
Um grande abraço.
Angela
(1) Carta escrita por uma geóloga que recentemente permaneceu durante 20 dias em Morro do Chapéu